Restava um copo meio cheio na mesa junto da cama. Agora era
só ele.
Meditava um corpo num canto da cama, com os cotovelos
apoiados nos joelhos e de olhar colado na água ainda trémula…
Chovia lá fora e Matias sabia que a maior tempestade estava
do lado oposto da janela, presa naquele quarto onde há tão pouco eram dois.
Instantes antes tinham gritado pelo nome um do outro. Instantes antes tinham-se
amado e caído num sono profundo. Pelo menos era o que Matias achava. Agora era
só ele, ou o pedaço dele ambulante que ficou, pois quando ela partiu, tomou um
trago de água e levou consigo muito mais do que memórias e histórias. Deixou
uma divisão totalmente vazia.
Amanhecia devagar, do mesmo modo que Matias se ia matando
emocionalmente, preso numa vivência que terminara. Vida macabra que o prendara
com tudo o que ansiava, e o apunhalava agora, retirando-lhe o mesmo, num só
gesto amargo. Cru.
Sentia a garganta fechada e, alcançando o copo do seu lado,
esforçava-se para acreditar que com um gole de água, tudo melhoraria. De lábios
entreabertos, os olhos ergueram-se à mínima luz que, envergonhada, entrava pela
janela. Como queimava esse delicado raio de sol! Ardia vivamente! Foi aí que o
Matias entendeu que, se ele olhasse, depois da chuva, havia um ligeiro brilho
alcançável.
Abre-se a porta chorosa. Interrompem-se, por um segundo, os
pensamentos com olhares ardentes de raiva, arrependimento e dor. Chocam os dois
corpos e revêem-se as almas, como se lhes arrancassem a pele e os unissem
debaixo da mesma. Matias sorri-lhe entre um beijo aliviado, “Sem ti, nada meu
em mim restava”.
Sem comentários:
Enviar um comentário